quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A norma culta nos dias atuais

Achei esta reportagem muito boa, do jornalista Aldo Pereira, do jornal Folha de São Paulo, do dia 25 de novembro de 2010. Não deu para postar antes... Segue:

"Apologia da norma culta

Muitos fatores concorreram, desde o descobrimento, para fragmentar a língua portuguesa de Caminha em dialetos brasileiros: extensão territorial, precariedade de comunicações, nível rudimentar da educação dos colonos, diversidade tribal afro-indígena.
Mas a literatura e a mídia atestam que sobrepaira na diversidade atual um dialeto minoritário associado a prestígio e poder.
Toda língua evolui, claro. Preferivelmente, contudo, em processo similar ao de lei e costumes, conducente à assimilação gradual das mudanças. Estabilidade de padrões é indispensável a organização social, a ponto de justificar coerção do Estado; pense na moeda e no sistema métrico.
A norma culta (hoje menos referida por esse nome), tem provido a língua de um referencial resguardado contra variações que, se prematuras e indiscriminadas, poderiam comprometer a eficiência da comunicação.
A norma culta tem favorecido também a  comunicação inteligente na atividade intelectual, na política e no ordenamento jurídico: nenhum sistema legal poderia operar com eficiência, em país algum, sem rigor gramatical e semântico, tanto na prescrição das leis quanto na jurisprudência.
Diante dessas evidências, porque a norma culta inspira tanta controvérsia episódica e veemente? A principal das várias razões pode ser sua conotação de etilismo tingido de racismo, a tácita e presunçosa inferência de que falar e escrever "bem" (em geral, extensão de outros privilégios no acesso ao saber) legitima a hegemonia duma classe.
Outra razão pode estar no desconhecimento de como variantes dialetais fragmentam as línguas. Quantos percebem, por exemplo, que a língua aprendida na infância é sempre um dialeto? Ou que a escrita é um dialeto da fala?
Quer se destine à leitura em voz alta (rádio, TV, artes cênicas, discursos, palestras), quer à leitura silenciosa processada no ritmo e grau de concentração do leitor, a escrita se caracteriza por atributos próprios e cumpre papel distinto do imediatismo da fala.
Por isso, caluniar a necessária identidade dialetal da norma culta para impugnar o padrão homogêneo de comunicação é o avesso do preconceito. Traz, entre outros contraproducentes efeitos, o de entorpecer a aquisição do conhecimento necessário à proficiência em outras disciplinas.
Terceira razão da crítica as vezes abusada que a norma cultua inspira talvez advenha do nome antipático. Experimente substituí-lo, digamos, por português acadêmico (no sentido de "aprendido na escola"), e ensiná-lo como segunda língua (em relação ao dialeto trazido de casa), com precauções como evitar correções em classe, para não humilhar o aluno principiante perante seus pares; melhor limitá-las à vistoria dos cadernos.
O ensino desse português acadêmico pressuporia rigor na escrita, limitada tolerância gramatical e vocabular na fala, mas liberdade ilimitada na prosódia: afinal, por que desbotar o colorido de pronúncia e entonação dos falares regionais do Brasil?"

Penso que de fato a norma culta é conhecida de uma pequena parte da população Brasileira, talvez apenas entre alguns da classe média e da classe alta da sociedade, devido a precariedade da educação no Brasil.
Quando escutamos um político ou um advogado falar, nos impressionamos com sua dialética. Por isso muitas vezes somos ludibriados por aqueles que falam bonito...
Penso que cada vez mais as pessoas agem como se fosse "feio", "cafona" falar "bem". Escrever então... Estamos criando uma cultura de simplificação e depreciação da nossa língua.
No trabalho mesmo, em trocas de e-mail estremeço ao ler vários erros ortográficos e de concordância. As conversas pela internet são cheias de abreviações, cada vez mais misturamos o inglês com o português, cada vez mais usamos gírias para nos expressar.
É uma pena. Penso que nossa língua é tão rica que deveríamos valorizá-la e não depreciá-la. Todos deveriam aprender o português, a norma culta, e adequar a sua fala à quem quer comunicar, utilizar-se do que chamamos "camaleão linguístico", ou seja, alterar a sua fala, adaptá-la de acordo com a situação em que se encontra e ao seu ouvinte.  
A língua portuguesa não é chata. Chatos somos nós, que não procuramos evoluir e sim estagnar ou "emburrecer". As pessoas tem preguiça de ler, de aprender e é por isso o Brasil não melhora, e enquanto não houver investimento na educação, continuaremos a ser um povo medíocre ou até pior. E quem sabe um dia nem norma culta haverá, cada um falará como quiser, o dialeto que quiser, sem regras de escrita. Caminhamos rumo ao caos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário